As alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 52/2006, de
15 de março, e pelo Decreto-Lei n.º 29/2014, de 25 de fevereiro, no regime
legal do papel comercial, contido no Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de março,
justificam a revisão do regime regulamentar aplicável a esse valor mobiliário
representativo de dívida, anteriormente previsto no Regulamento da CMVM n.º
1/2004.
A intervenção regulatória que agora se apresenta concretiza
o regime legal contido na atual versão do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de
março e os demais aspetos do regime do papel comercial, com vista a estimular o
recurso a este instrumento por um conjunto alargado de emitentes e permitir,
assim, a sua utilização como uma alternativa real e efetiva de financiamento
das empresas e estímulo à sua emissão, admissão e negociação, quando a economia
reflete, ainda, os impactos da crise financeira global de 2008.
As alterações ao enquadramento jurídico do papel comercial em 2004 e 2006 não
tiveram os efeitos pretendidos no que diz respeito ao desenvolvimento do
mercado primário e secundário do papel comercial. Este instrumento financeiro
de curto prazo acabou por ser transformado muitas vezes num sucedâneo do
crédito bancário de prazo mais alargado através, de práticas de renovação
sistemática das emissões e de uma retenção em carteira pelas instituições de
crédito.
O papel comercial deverá ser reconduzido, assim, à sua identidade e função
económicas naturais de instrumento de financiamento de curto prazo das empresas
através do mercado, constituindo-se não só como uma verdadeira alternativa ao
crédito bancário, como, mais do que isso, parte de uma nova cultura de
financiamento das empresas, promovendo o alargamento da base de investidores e
ampliando o leque de entidades legitimadas para a respetiva emissão.
Os objetivos prosseguidos com a emissão de papel comercial no que respeita ao financiamento
das empresas e ao reforço e dinamização do mercado de capitais, legitimam o
tratamento deste valor mobiliário de natureza monetária ao abrigo de um regime
jurídico especial face ao regime geral do Código dos Valores Mobiliários, que
se encontra definido na atual versão do Decreto-Lei nº 69/2004, de 25 de março.
Este regime legal carece, contudo, de regulamentação adicional, por força das
remissões incluídas naquele regime para regulamento da CMVM, aproveitando-se
para clarificar, por esta via, alguns aspetos daquele regime, a fim de
facilitar aos utilizadores a sua correta aplicação e garantir, assim, um quadro
regulatório adequado ao objetivo de dinamização do papel comercial como
instrumento de financiamento das empresas.
O presente regulamento destina-se, pois, a concretizar esse regime jurídico
especial contido na atual versão do Decreto-Lei nº 69/2004, de 25 de março.
Na elaboração do presente regulamento a Comissão do Mercado de Valores
Mobiliários continua a ter em particular atenção a natureza de curto prazo
deste valor mobiliário, definindo, com especial relevância, o que se deve
entender por rácio de autonomia financeira adequado enquanto fator de
legitimação para a emissão de papel comercial, bem como os aspetos que dizem
respeito à publicação do relatório semestral, caso o papel comercial não tenha
sido admitido à negociação em mercado regulamentado, não esquecendo a
necessidade de concretização do dever de divulgação de informação relevante ao
mercado, quando esta seja suscetível de comprometer a capacidade de reembolso
da emissão e consequentemente, de afetar o preço de mercado do papel comercial.
O presente regulamento foi objeto de consulta pública, refletindo a presente
versão algumas das sugestões feitas pelos respondentes, nomeadamente, no que
diz respeito à indicação do limiar do rácio de autonomia financeira, à
introdução de novos itens no conteúdo do relatório semestral e à determinação
das situações em que o mesmo é exigível.
Assim, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 353.º e no n.º 1
do artigo 369.º do Código dos Valores Mobiliários, no artigo 21.º do
Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de março, e na alínea n) do artigo 9.º do
Estatuto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, o Conselho Diretivo
aprova o seguinte regulamento:
Capítulo I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Rácio de autonomia financeira
1 - Para os efeitos do disposto no artigo 4º, nº 1, alínea
e) do Decreto-Lei nº 69/2004, de 25 de março, considera-se existir um rácio de
autonomia financeira adequado quando a estrutura de capitais do emitente
permita assegurar, depois da emissão de papel comercial, um rácio igual ou
superior a 35%.
2 - O rácio de autonomia financeira referido no número anterior é calculado a
partir das últimas demonstrações financeiras individuais ou consolidadas
aprovadas, através da seguinte fórmula:
Autonomia financeira = CP/AL x 100
em que:
Capitais próprios (CP) definidos nos termos da alínea a) do artigo 3º do
Decreto-Lei nº 69/2004, de 25 de março;
Ativos líquidos (AL) reconhecidos de acordo com o normativo contabilístico
aplicável.
Artigo 2º
Forma de liquidação dos juros relativos à emissão de papel comercial
Os juros do papel comercial podem ser liquidados:
a) Na data do reembolso;
b) Em intervalos regulares de prazo não inferior a um mês,
com eventual exceção do primeiro prazo, devendo a data da última contagem de
juros coincidir com a data do vencimento dos valores mobiliários ou do seu
reembolso.
Artigo 3.º
Condições de rateio
Quando, numa oferta pública de distribuição de papel
comercial, a quantidade dos valores mobiliários objeto de ordens de subscrição
pelos destinatários for superior à quantidade dos valores mobiliários
oferecidos procede-se a rateio na proporção dos valores mobiliários pretendidos
pelos destinatários nas condições definidas na oferta, salvo se contrariar
critério diverso resultante de disposição legal aplicável.
Capítulo II
Nota informativa
Artigo 4.º
Instrução do pedido de aprovação de nota informativa de oferta pública
1 - Para efeitos do disposto no nº 2, do artigo 12º do Decreto-Lei n.º 69/2004,
de 25 de março, o pedido de aprovação da nota informativa é instruído com os
seguintes elementos:
a) Cópia de relatórios de gestão e de contas aprovados, pareceres dos órgãos de
fiscalização e da certificação legal de contas ou de auditoria às contas da
entidade emitente (individuais ou consolidadas, caso o emitente seja obrigado a
elaborar estas últimas) efetuada por um revisor oficial de contas ou por uma
sociedade de revisores oficiais de contas relativos, pelo menos, ao último
exercício anterior à emissão, ou indicação do sítio de internet onde podem ser
consultadas;
b) Informação sobre notação de risco da emissão ou do programa de emissão ou
notação de risco de curto prazo da entidade emitente, atribuída por agência de
notação de risco registada na Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos
Mercados (ESMA) ou notação de risco emitida por Agência de Notação Externa
(ECAI), registada junto do Banco de Portugal, caso existam;
c) Cópia da garantia, a favor dos detentores, que assegura o cumprimento das
obrigações de pagamento decorrentes da emissão ou do programa, caso aplicável;
d) Cópia do contrato estabelecido entre o emitente e um patrocinador da emissão
que detenha em carteira pelo menos 5% da emissão até à maturidade, caso
aplicável;
e) Código de identificação dos valores mobiliários de natureza monetária que
são objeto da oferta, ainda que de natureza provisória;
f) Código de acesso à certidão permanente do registo comercial do emitente;
g) Projeto da Nota Informativa.
2 - A junção de documentos pode ser substituída pela indicação de que os mesmos
já se encontram, em termos atualizados, em poder da CMVM.
3 - A CMVM pode solicitar ao oferente, ao emitente, ao intermediário
financeiro, ao patrocinador ou a qualquer pessoa que com estes se encontre em
alguma das situações previstas no n.º 1 do artigo 20.º do Código dos Valores Mobiliários,
as informações complementares que sejam necessárias para a apreciação do pedido
de aprovação da Nota Informativa.
Artigo 5.º
Caducidade da aprovação de nota informativa
A aprovação da nota informativa a que se refere o artigo
anterior caduca caso a referida nota não seja divulgada no prazo de um ano a
contar da data do último relatório e contas em que tal aprovação se baseie.
Artigo 6.º
Verificação prévia de requisitos
Nas ofertas particulares de papel comercial emitido por
entidade sem certificação legal de contas ou auditoria às contas efetuada por
um revisor oficial de contas ou por uma sociedade de revisores oficiais de
contas, o intermediário financeiro ou o patrocinador da emissão, conforme
aplicável, e independentemente de outros deveres impostos por lei, deve
proceder à prévia verificação dos requisitos previstos no artigo 4.º do
Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de março, se aplicáveis, fazendo constar da nota
informativa, nos serviços por estes prestados, que realizou tal verificação.
Artigo 7.º
Divulgação de nota informativa
1 – Sem prejuízo do disposto na alínea a) do artigo 19º do Decreto-Lei n.º
69/2004, de 25 de março, a divulgação da nota informativa nas ofertas públicas
de papel comercial é obrigatoriamente realizada no sítio da Internet da
entidade emitente e das entidades colocadoras e através do sistema de difusão
de informação da CMVM até ao início da oferta.
2 – Previamente à admissão à negociação, a entidade emitente divulga a nota
informativa através do sistema de difusão de informação da CMVM quando se trate
de mercado regulamentado e através do seu sítio da Internet quando se trate de
admissão à negociação em qualquer outra plataforma de negociação.
3 - Sem prejuízo do disposto no nº 1 do artigo 233º do Código de Valores
Mobiliários, o investidor qualificado que subscreva mais de 50% da emissão do
papel comercial deve assegurar previamente à admissão à negociação, a
divulgação da nota informativa, através do sistema de difusão de informação da
CMVM quando se trate de admissão a mercado regulamentado e através do seu sítio
da Internet quando se trate de admissão à negociação em qualquer outra
plataforma de negociação.
4 – Sempre que a admissão à negociação em mercado regulamentado ou em qualquer
outra plataforma de negociação não tenha sido requerida pela própria emitente,
esta tem o dever de cooperar com o requerente a expensas deste, com o que for
necessário para a referida admissão.
5 - Sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 205º do Código dos Valores
Mobiliários, quando a entidade gestora do mercado regulamentado admita papel
comercial à negociação sem autorização da entidade emitente, nos termos
previstos no nº 4 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 69/2004, de 25 de março, deve
informar esta desse facto.
Capítulo III
Deveres de informação
Artigo 8.º
Informação Complementar
A informação complementar a divulgar previamente a cada emissão integrada em
programa de emissão de papel comercial, mencionada no nº 3 do artigo 17º do
Decreto-Lei nº 69/2004, de 25 de março deve conter, pelo menos, a seguinte
informação obrigatória:
a) Identificação da entidade emitente;
b) Montante e prazo da emissão;
c) Valor nominal do valor mobiliário;
d) A data de subscrição e a data de reembolso;
e) O modo de determinação da taxa de juro da emissão;
f) A identificação da entidade registadora;
g) Natureza e âmbito das garantias prestadas, caso existam, e identificação das
respetivas entidades garantes, se aplicável;
h) Indicação da notação de risco, caso exista;
i) Indicação do rácio de autonomia financeira, se aplicável;
j) Indicação do patrocinador, se aplicável.
Artigo 9.º
Relatório semestral
1 - O relatório semestral a que se refere o n.º 7 do artigo 15.º do Decreto-Lei
n.º 69/2004, de 25 de março, contém informação relevante para aferir o valor, o
desempenho e a capacidade de reembolso do papel comercial, com o conteúdo
indicado no modelo de relatório semestral anexo ao presente diploma, do qual
faz parte integrante.
2 - A publicação do primeiro relatório semestral deverá ocorrer a 31 de julho
ou a 31 de janeiro, consoante a que seja a data mais próxima da emissão do
papel comercial, ou 6 meses após a referida emissão.
3 - Nas situações de ofertas públicas lançadas de acordo com o artigo 12º, nº 4
do Decreto-Lei n.º 69/2004, de 25 de março e de ofertas particulares emitidas
por entidade sem certificação legal de contas ou auditoria às contas efetuada
por um revisor oficial de contas ou por uma sociedade de revisores oficiais de
contas, o intermediário financeiro ou o patrocinador de emissão, conforme
aplicável, deve garantir a produção e a divulgação do relatório semestral.
4 - Nos casos de ofertas particulares emitidas por entidade sem certificação
legal de contas ou auditoria às contas efetuada por um revisor oficial de
contas ou por uma sociedade de revisores oficiais de contas, o relatório
semestral, apenas, tem que ser divulgado aos respetivos titulares.
5 - Nas situações de ofertas particulares emitidas por entidade com
certificação legal de contas ou auditoria às contas efetuada por um revisor
oficial de contas ou por uma sociedade de revisores oficiais de contas fica
dispensada a apresentação do relatório semestral.
Artigo 10.º
Divulgação de informação relevante
1 – Para os efeitos do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 20º-A do Decreto-Lei nº
69/2004, de 25 de março, considera-se informação relevante qualquer situação
suscetível de afetar de modo previsível e significativo a capacidade do
emitente de proceder ao reembolso da emissão ou de assegurar o pagamento da
remuneração, em particular:
a) Situações de incumprimento em operações de financiamento;
b) Recurso do emitente ao processo de insolvência, incluindo os planos de
recuperação e os processos especiais de revitalização, apresentação de pedido
de declaração de insolvência, bem como as sentenças emitidas no âmbito desses
processos.
2 – A informação referida no número anterior é imediatamente divulgada ao
mercado pela entidade emitente no sistema de difusão de informação da CMVM e
enviada para a entidade gestora do mercado.
3 – Os emitentes, que tenham exclusivamente papel comercial admitido à
negociação em mercado regulamentado devem, no momento em que é solicitada a
admissão, nomear, de acordo com o disposto no nº 4, do artigo 233.º do Código
dos Valores Mobiliários, um representante com poderes bastantes para as
relações com o mercado e com a CMVM e solicitar a esta última a atribuição de
senha de acesso e de utilizador, bem como de um certificado digital para
utilização do sistema de difusão de informação da CMVM.
4 – Os emitentes devem guardar segredo sobre a existência e o conteúdo da
informação referida no nº 1 até à sua divulgação nos termos legalmente
exigidos, após o que a divulgação da referida informação pode realizar-se através
de outros meios de comunicação.
Artigo 11.º
Outros deveres de informação
1 – Independentemente da sua admissão à negociação em mercado regulamentado ou
em qualquer outra plataforma de negociação, as entidades emitentes de papel
comercial objeto de oferta pública de distribuição informam o público sobre os
resultados da oferta e de rateio, quando exista.
2 – A informação referida no número anterior é imediatamente disponibilizada ao
público por um intermediário financeiro ou em sessão especial de mercado
regulamentado, consoante aplicável, através do sistema de difusão de informação
da CMVM e em qualquer outro local onde tenha sido divulgada a nota informativa
de oferta pública em causa.
Artigo 12.º
Meios gerais de divulgação
1 – Sem prejuízo do previsto no Decreto-Lei nº 69/2004, de 25 de março e no
disposto em especial neste Regulamento sobre o modo e o tempo de divulgação de
informação, as informações exigidas no presente regulamento são:
a) Disponibilizadas ao público no prazo de 7 dias a contar da
data da respetiva deliberação pelos órgãos sociais competentes ou da data do
documento que legalmente comprove o objeto de divulgação;
b) Divulgadas e mantidas no sítio da Internet da entidade
emitente durante, pelo menos, um ano, sem prejuízo da sua divulgação pelo
emitente através do sistema de difusão de informação da CMVM, quando for
aplicável.
2 – O dever de divulgação de informação através do sítio da Internet pode ser
cumprido por sociedade com a qual a entidade emitente se encontre em relação de
domínio ou de grupo.
3 - A divulgação de informação no sistema de difusão de informação da CMVM deve
ser efetuada em momento não posterior à sua divulgação por outros meios.
4 – As alterações ou retificações à informação divulgada devem ser divulgadas
pelos mesmos meios e termos da informação a alterar ou retificar.
Capítulo IV
Disposições finais e transitórias
Artigo 13.º
Norma revogatória
É revogado o Regulamento da CMVM n.º 1/2004, sem prejuízo do disposto no artigo
seguinte.
Artigo 14.º
Norma transitória
O Regulamento da CMVM n.º 1/2004 continua a aplicar-se, apenas, ao papel
comercial emitido antes da data de entrada em vigor do presente regulamento e
cujo reembolso integral não tenha àquela data ocorrido.
Artigo 15.º
Entrada em vigor
O presente regulamento entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Lisboa, 09 de outubro de 2014 - O Presidente do Conselho Diretivo, Carlos
Tavares, o Vogal do Conselho Diretivo, Carlos Alves.
ANEXO
(a que se refere o artigo 9º do Regulamento)
Modelo de relatório semestral